quinta-feira, 15 de agosto de 2013

EDUCAÇÃO: ABORDAGEM DIFERENCIAL E DINÂMICA DA INTELIGÊNCIA




D
e acordo com Bock et al (2001), pode-se dizer que após o simpósio de 1921  os teóricos se dividiram, em dois grandes blocos, naquilo que se refere à compreensão da inteligência humana: os da Abordagem Psicométrica da Psicologia Diferencial, e os da Abordagem Psicométrica da Psicologia Dinâmica.

A medição contemporânea da inteligência pode remontar a uma de duas tradições muito diferentes. Uma tradição concentrada em um nível inferior, as capacidades psicofísicas, tais como acuidade sensorial, força física e coordenação motora; a outra focalizada em um nível superior, capacidade de julgamento, que nós, tradicionalmente, descrevemos como relacionadas ao pensamento (STERNBERG, 2000, p. 401-402, grifo nosso).

Em sentido etimológico, conforme dito por Pasquali (1996 apud GUTTMAN, 1971), psicometria seria toda a classe de medida em Psicologia. Em seu sentido mais restrito, como é normalmente entendida, psicometria constitui uma das várias formas de medição em Psicologia.

A medida em ciências do comportamento, notadamente na Psicologia, deveria ser chamada puramente de psicometria, similarmente ao que ocorre em ciências afins a ela, onde se falam de sociometria, econometria, politicometria, etc. Psicometria, contudo, tem sido abusivamente utilizada dentro de um contexto muito restrito, referindo-se a testes psicológicos e escalas psicométricas. De qualquer forma, a psicometria ou medida em Psicologia se insere dentro da teoria da medida em geral que, por sua vez, desenvolve uma discussão epistemológica em torno da utilização do símbolo matemático (o número) no estudo científico dos fenômenos naturais. Trata-se, portanto, de uma sobreposição, ou melhor, de uma interface entre sistemas teóricos de saber diferentes, tendo a teoria da medida (PASQUALI, 1996 p. 21, grifo nosso).

Na verdade, Ciência empírica e Matemática são sistemas teóricos ou de conhecimento totalmente diferentes, têm objetos e metodologias próprios, distintos e irreversíveis entre si.

A Ciência tem como objeto os fenômenos da realidade, ao passo que a Matemática estuda como seu objeto o símbolo numérico, que é um conceito e não uma realidade empírica e nem uma propriedade desta realidade (PASQUALI, 1996 apud FREGE, 1884).

A metodologia da Ciência é a observação sistemática e a da Matemática é a dedução; o critério de verdade para a Ciência é o teste empírico, ao passo que para a Matemática é a consistência interna do argumento.

Abordagem da Psicologia Diferencial da Inteligência

A Psicologia Diferencial, baseada no positivismo, acredita que a tarefa da ciência é estudar aquilo que é possível de se medir, ou seja, aquilo que é positivo. Assim, a inteligência, para ser estudada, tem que ser observada, mesmo não podendo ser observada diretamente, mas pode ser medida através dos comportamentos humanos, que são expressões da capacidade cognitiva. Dessa forma, se vê e se mede a inteligência humana através de sua capacidade de verbalizar ideias, compreender instruções, perceber a organização espacial de um desenho, resolver problemas, adaptar-se a situações novas, comportar-se criativamente frente a uma situação. A inteligência, nesta abordagem, seria um composto de habilidades e poderia ser medida por meio dos conhecidos testes psicológicos de inteligência (BOCK et al, 2001).

As primeiras conceptualizações de inteligência datam do final do século XIX e devem-se, em grande parte, ao vasto contributo de Sir Francis Galton no movimento da testagem. Este biólogo inglês, que nutria um especial interesse pela hereditariedade humana (ou não fosse ele, curiosamente, primo de Charles Darwin), foi responsável pelo primeiro vasto corpo de dados sistemáticos sobre as diferenças individuais em processos psicológicos simples, nomeadamente no que respeita à sensibilidade a estímulos visuais, auditivos e cinestésicos, ao tempo de reação e a outras funções sensório-motoras simples. Ele tinha a convicção de que os testes de discriminação sensorial podiam servir como instrumento de avaliação da capacidade intelectual do sujeito (LEMOS, 2007, p.10).

Francis Galton (1822-1911) foi um dos que acreditava que a inteligência era uma função das capacidades psicofísicas e, por muitos anos, manteve um laboratório bem-equipado, onde se media os visitantes em uma ampla variação de habilidades psicofísicas e de sensibilidades, tais como: discriminação de peso; capacidade para ouvir pequenas diferenças entre as notas musicais, e vários testes de força física. Clark Wissler, um dos seus seguidores, tentou detectar relações entre os testes variados, as quais unificariam as várias dimensões da inteligência logo enfraqueceu, quase caindo no esquecimento, embora reaparecessem muitos anos mais tarde (STERNBERG, 2000 apud GALTON, 1883).

A única informação que nos atinge, vinda dos acontecimentos externos, passa, aparentemente, pelo caminho de nossos sentidos; quanto maior o discernimento que os sentidos tenham da diferença, maior o campo em que podem agir nosso julgamento e nossa inteligência. [   ] Galton também notou que os idiotas tendem a ser deficientes na habilidade para discriminar calor, frio, e dor, e essa observação, reforçou ainda mais sua convicção de que a capacidade de discriminação sensorial deve ser, geralmente, mais elevada entre os intelectualmente mais capazes (ANASTASI, 1972, p. 9).

Os métodos da escala de avaliação e do questionário foram introduzidos por Galton, assim como o uso da técnica de associação livre, depois utilizada para outros objetivos. Ele também foi responsável pelo desenvolvimento de métodos estatísticos para a análise de dados sobre diferenças individuais. E ainda selecionou e adaptou técnicas, anteriormente deduzidas pelos matemáticos, colocando-as de forma que pudessem permitir o seu uso por investigadores sem treinamento matemático, e que desejassem tratar, quantitativamente, os resultados.

O famoso psicólogo Edwin Boring assim definiu a inteligência: seja o que for, o que os testes medem. Esta definição não é compartilhada pela maioria dos psicólogos cognitivos, muito embora a tradição de se tentar compreender a inteligência através da medição por testes tem uma longa história (STERNBERG, 2000, BORING, 1923).

Porquanto, uma alternativa à abordagem da Psicologia Diferencial ou Psicofísica foi desenvolvida por Alfred Binet (1857-1911). Ele e seu colaborador, Theodosius Simon, também tentaram avaliar a inteligência, mas seu objetivo era muito mais prático do que puramente científico.

Binet fora solicitado a planejar um procedimento para distinguir os alunos normais dos mentalmente retardados (Binet & Simon, 1916). Assim, planejaram medir a inteligência como uma função da capacidade de aprender, dentro de um ambiente acadêmico. Na concepção de Binet, o julgamento era a explicação para a inteligência, não a acuidade, a força ou a habilidade psicofísica (STERNBERG, 2000, p.401 apud BINET & SIMON, 1916).

Para Binet, o pensamento inteligente ou julgamento mental, compreende três elementos distintos: direção, adaptação e crítica. (i) a direção envolve saber o que tem de ser feito e como fazê-lo; (ii) a adaptação refere-se a habituar uma estratégia para realizar uma tarefa e, depois, monitorizar essa estratégia durante sua implementação; (iii) e a crítica é sua capacidade para criticar seus próprios pensamentos e ações (STERNBERG, 2000, BINET & SIMON, 1916).

Direção e adaptação, na concepção de Binet, estão muito próximas das concepções atuais de inteligência, assim como a sua noção previdente de crítica, considera a valorização atual dos processos metagognitivos como um aspecto-chave da inteligência.
           
[...] Digamos que nada é tão enganoso como a aparência física da inteligência; que é necessário reagir contra suas impressões instintivas, e que seria inútil de atribuir uma criança, que pode ser boa e inteligente, a responsabilidade um físico ingrato [   ] quando for preciso julgar um aluno específico, que se comece por um exame psicológico de sua inteligência, e de seu caráter, e se os resultados deste exame são claramente desfavoráveis ao sujeito examinado; neste caso somente, quer dizer, neste papel totalmente de segundo plano, que a consideração dos sinais físicos da inteligência poderia intervir, para ajuntar uma pequena confirmação e uma explicação a um julgamento que nós teríamos feito, por outras razões e segundo outros documentos; pois, a inteligência de uma criança se demonstra e se prova unicamente por suas manifestações intelectuais (ZAZZO, 2010, p.116-117 apud BINET, 1909, p. 30, grifo nosso).

Ainda de acordo com Zazzo (2010), no capítulo final de seu último livro, publicado, em 1911, sob o título: Ideias modernas sobre as crianças, Binet faz críticas veladas aos promotores da Psicologia Diferenciada e aos seus testes: A antiga pedagogia é como uma carruagem fora de moda: range, mas ainda pode ser útil. A nova pedagogia tem o aspecto de uma máquina de precisão; mas as peças parecem não ter relação umas com as outras, e a máquina tem um defeito: ela não funciona. [...] nos ensinaram sobre as coisas da educação. [...] eu procurei meu caminho entre a antiga pedagogia e aquela que nos prometem os inovadores, gente do laboratório. [...] então guardemos sua orientação, seu gosto pelos problemas reais. [...] Quanto aos inovadores, seu mérito está em ter feito valer, na pedagogia como na pedologia, a experimentação, a exigência de controle e de precisão. Mas seus testes aplicados às cegas e suas experiências muito fragmentárias são, na maior parte das vezes, inúteis: Essa gente não tem noção da escola e da vida [...] eles parecem nunca colocar a cara para fora de seu laboratório [...] a antiga pedagogia deve nos apresentar os problemas a serem estudados; a nova pedagogia, os procedimentos de estudo.

Eu creio que o conhecimento das aptidões das crianças é o mais belo problema da pedagogia. Ele ainda não foi tratado em nenhum lugar, pelo menos do meu conhecimento, e nós não possuímos atualmente nenhum procedimento seguro para procurar as aptidões de um sujeito qualquer, criança ou adulto. [   ] métodos e exames que esclareceriam as vocações, as aptidões e também as inaptidões seriam incomensuravelmente úteis a todos. Assim que a parte teórica do problema for resolvida, as aplicações práticas não tardarão, e toda uma organização intelectual de posicionamentos ocorreria, eu sei disto. Eis as grandes perspectivas para a Psicologia e a Pedagogia experimentais [...] (ZAZZO, 2010, p. 128-129 apud BINET, 1910. p. 5-11).

Lewis Terman, da Universidade de Stanford, baseou-se no trabalho de Binet e Simon, e construiu a versão mais antiga do que veio a ser denominado de Escalas de Inteligência Stanford-Binet. Durante anos, ele foi o padrão para os testes de inteligência Wechsler.

Wechsler, como Binet, tinha uma concepção de inteligência que ultrapassava aquilo que seu próprio teste media. Embora Wechsler acreditasse, evidentemente, no valor de tentar-se medir a inteligência, não limitava sua concepção de inteligência aos escores de testes. Ele acreditava que a mesma é fundamental em nossa vida cotidiana. Ela não é simplesmente um escore de teste ou alguma coisa que usamos na escola. Usamos nossa inteligência não apenas para realizarmos testes e fazermos temas de casa, mas também para nos relacionarmos com as pessoas, desempenharmo-nos com eficiência em nossos empregos e administrarmos nossas vidas em geral (STERNBERG, p. 404, grifo nosso).

Medir a inteligência é apenas uma das diversas abordagens para estudá-la, e duas pelo menos se destacam: (1) estruturalismo versus funcionalismo e (2) natureza versus educação. Os psicólogos cognitivos sempre se perguntam: (a) deve-se concentrar os estudos na estrutura ou nos processos? (b) O que fundamenta a inteligência: a herança genética de um indivíduo, os atributos por ele adquiridos ou alguma espécie de interação entre ambos?

Destarte, os psicólogos interessados na estrutura da inteligência têm confiado na análise fatorial como o instrumento indispensável para suas pesquisas.

A análise fatorial é um método estatístico para separar um construto (inteligência), neste caso, em muitos fatores ou habilidades hipotéticas que os pesquisadores acreditam formar a base das diferenças individuais no desempenho nos testes. Os fatores específicos derivados, naturalmente, ainda dependeriam das perguntas específicas formuladas e das tarefas avaliadas (STERBERNG, 2000, p.404).

A análise fatorial baseia-se em estudos de correlação. Na pesquisa sobre inteligência, uma análise deste tipo pode envolver as seguintes etapas: (i) dar a um grande número de pessoas vários testes diferentes de capacidades; (ii) determinar as correlações entre todos esses testes; (iii) e analisar estatisticamente essas correlações para simplificá-las em um número relativamente pequeno de fatores, que resumem o desempenho das pessoas nos testes.

Embora os investigadores tenham concordado com esses procedimentos, os resultados obtidos foram divergentes entre os seus diversos teóricos. As teorias fatoriais mais expressivas foram as de Spearman, de Thurstone, de Guilford, de Cattell, de Vernon e de Carrol.

Análise Fatorial ou Teoria dos Dois fatores

Charles Spearman (1863-1945), utilizando estudos analítico-fatoriais foi reconhecido pelo seu mérito como o idealizador da análise fatorial ou teoria dos dois fatores.

A primeira teoria de organização do traço, baseada em analise estatística de resultados de teste, foi desenvolvida por Spearman. Na formulação original, ela sustentava que todas as atividades intelectuais participam de um único fator comum, chamado de fator geral ou “g”. Além disso, a teoria supunha numerosos fatores específicos denominados de “e”, cada um dos quais, estritamente, específico de uma única atividade. A correlação específica entre duas funções quaisquer era, dessa forma, atribuída ao fator “g”. Desta forma, quanto maior a saturação de duas funções “g”, tanto maior a correlação entre elas. Por outro lado, a presença dos fatores específicos tendia a diminuir a correlação entre funções (ANASTASI, 1972).
 
Spearman concluiu que a inteligência pode ser compreendida tanto em função de um único fator geral que permeia o desempenho em todos os testes de capacidade mental, como em função de um conjunto de fatores específicos, cada um dos quais estando envolvido no desempenho em apenas um único tipo de teste de capacidade mental. Os fatores específicos são de interesse casual apenas, devido à sua estrita aplicabilidade. O fator geral, que ele denominou de “g”, fornece a chave para compreender-se a inteligência (STERNBERG, 2000, p.404, grifo nosso).

De acordo com Anatasi (1972, p.395), “o principal objetivo da análise fatorial é simplificar a descrição dos dados, através da redução do número de dimensões ou variáveis necessárias”. O fator geral “g” dependeria de uma energia mental essencialmente biológica e inata, enquanto os fatores específicos dependeriam da aprendizagem, ou seja, seriam treináveis e educáveis, e ativados pelo fator g (ALMEIDA, 2002 apud ALMEIDA, 1988; RIBEIRO, 1998).

Na formulação de sua teoria, Spearman aceitou a possibilidade de pequenos fatores de grupo, muito limitados e desprezíveis. Depois de investigações posteriores, por parte de seus discípulos, ele incluiu fatores de grupo muito mais amplos, tais como: a capacidade aritmética, mecânica e de linguagem.

Desde o início, Spearman compreendeu que a Teoria dos Dois Fatores precisava ser limitada. Quando as atividades comparadas são muito semelhantes, pode ocorrer certo grau de correlação, além da que pode ser atribuída ao fator “g”. Assim, além dos fatores gerais e específicos, pode haver outra classe de fatores intermediários, nem tão rigorosamente específicos quanto os fatores e, nem tão universais quanto o “g”. Esse fator, comum a um grupo de atividades, mas não a todas, tem sido denominado fator de grupo (ANASTASI, 1972, p. 401, grifo nosso).

Capacidades Mentais Primárias

Louis Thurstone (1887-1955), segundo Sternberg (2000), concluiu que o cerne da inteligência reside não num único fator, mas em sete desses fatores, que ele identificou como capacidades mentais primárias. Já para Anastasi (1972), Thurstone propôs, aproximadamente, doze fatores grupais, confirmando os sete como os mais frequentemente aceitos, conforme descritos no quadro abaixo. 



FATOR DE MEDIDA
CAPACIDADE MENTAL
FORMAS DE MEDIÇÃO
Compreensão Verbal
É o principal fator em testes como os de compreensão de leitura, analogias verbais, sentenças desorganizadas, raciocínio verbal e comparação verbal, e comparação de provérbios.
Medida por meio de testes de vocabulário
Fluência Verbal
Encontrado em testes de anagramas, rimas ou apresentação de nomes de certa categoria (por exemplo, nomes de meninos ou de palavras que comecem com a mesma letra.
Medida por testes de tempo limitado que exigem que o tomador do teste pense em tantas palavras quantas possíveis que comecem com uma dada letra
Raciocínio Indutivo
Originalmente, Thurstone propôs um fator indutivo e um dedutivo. A melhor medida do último era feita através de testes de raciocínio silogístico, e o primeiro por testes que exigiam que o sujeito descobrisse uma regra, tal como ocorre num teste de completação de série de números. No entanto, a prova de um fator indutivo. Além disso, outros investigadores sugerem um teste de raciocínio geral, cuja melhor medida é feita por testes de raciocínio aritmético.
Medido por testes como tarefas de completar analogias e séries numéricas
Visualização Espacial
Talvez este fator represente geométricas ou espaciais fixas, e o outro, visualização de mudanças, na qual transformações ou posições transformadas precisam ser visualizadas. Existem também provas de um terceiro fator de imagens cinestéticas.
Medida por testes que exigem rotação mental de figuras de objetos
Número
Identifica-se mais diretamente com rapidez e precisão de cálculo aritmético.
Medido por testes de cálculos e por resolução de problemas matemáticos simples
Memória Associativa
É encontrado, principalmente, em testes que exigem memorização automatizada de pares associados. Existem algumas provas segundo as quais esse fator pode refletir até que ponto os recursos mnemônicos são utilizados.
Medida por testes de evocação de palavras e de imagens
Rapidez Perceptiva
Apreensão rápida e precisa de minúcias, semelhanças e diferenças visuais. Este fator pode ser o mesmo já identificado como fator de rapidez, por investigadores anteriores.
Medida por testes que exigem que o tomador do teste reconheça pequenas diferenças em figuras ou risque os as em fileiras de letras variadas

 Quadro: Fatores de Medida da Inteligência de Thurstone
                                                                                   Fonte: Adaptado de Sternberg (2000, p. 404) e de Anastasi (1972, p. 402-403)

Modelos Multidimensionais de Inteligência

J.P. Guilford (1967-1982) desenvolveu o modelo de estrutura do intelecto, incluindo até 150 fatores da mente, completamente oposto ao Modelo do Fator Único “g”, de Spearman.

Para Guilford, segundo Sternberg (2000): a inteligência pode ser compreendida em função de um cubo, conforme a figura abaixo, que representa a interseção de três dimensões: várias operações, conteúdos e produtos, onde (i) as operações são simplesmente processos mentais, como a memória e a avaliação, ou seja: fazer julgamento, tais como determinar se uma dada declaração é fato ou opinião, baseia-se no pensamento racional ou na emoção ou no prejuízo; (ii) os conteúdos são os tipos de termos que aparecem em um problema, tais como os semânticos, como palavras, e os visuais, como figuras; (iii) os produtos são os tipos de respostas exigidas, tais como unidades, ou seja: palavras, números ou figuras simples, classes/hierarquias e deduções.

Entretanto, para muitos psicólogos, a contribuição mais valiosa de Guilford foi sugerir os vários tipos de operações mentais, de conteúdos e de produtos em suas concepções e em suas avaliações da inteligência.

                                               Figura: Estrutura da Inteligência de Guilford
                                                               Fonte: Extraído da Figura 14.2 de Sternberg (2000, p. 406)

Modelos Hierárquicos da Inteligência

O primeiro modelo hierárquico de inteligência foi desenvolvido por Philip E. Vernon, em 1950, onde observou uma divisão geral entre capacidades mecânico-práticas e educativo-verbais.

Vernon propõe uma teoria em que, no topo da hierarquia, emerge o fator g de Spearman; no nível seguinte surgem dois fatores de grande grupo: verbal-educativo e perceptivo-mecânico; em seguida estes fatores subdividem-se em fatores de pequeno grupo ou secundários, bastante próximos dos fatores de Thurstone; e, finalmente, um conjunto bastante instável de fatores ainda mais específicos. Numa formulação posterior do seu modelo, ele fez correlações entre fatores, especialmente os relacionados com a educação. As habilidades científicas e técnicas, por exemplo, estariam relacionadas com habilidades espaciais, mecânicas e numéricas. (ALMEIDA, 2002 apud ALMEIDA, 1988; ANASTASI, 1990; RIBEIRO, 1998; STERNBERG & PRIETO, 1997; ANASTASI, 1990).

O segundo modelo hierárquico de inteligência foi elaborado por Raymond Cattell, em 1971, estabelecendo que a inteligência geral abrange dois subfatores principais: a capacidade fluida, que envolve a rapidez e a exatidão do raciocínio abstrato, especialmente para novos problemas; e capacidade cristalizada, que envolve conhecimento e vocabulário acumulados. Agrupados nesses dois principais subfatores estão outros, mais específicos. 

Cattell propõe uma segunda teoria hierárquica da inteligência, conhecida pela teoria da inteligência fluida (gf) e cristalizada (gc). Para Cattell, o fator g pode subdividir-se numa inteligência fluida (mais confinada ao próprio fator geral de Spearman) e numa inteligência cristalizada (capacidades assentes no uso das habilidades). Bastante na linha de Thurstone e de Guilford, Cattell defende a existência de dezenove fatores primários ou de primeira ordem, conforme o quadro abaixo (ALMEIDA, 2002).
Quadro: Fatores Primários Identificados por Cattel
Fonte: Almeida (2002)

Ainda segundo Almeida (2002), a partir de correlações estes fatores primários, Horn & Cattell  apresentaram vários fatores secundários ou de segunda ordem, conforme se pode vê no quadro abaixo.






FATOR
CARACTERIZAÇÃO DO FATOR
Compreensão verbal (V)
Compreensão de palavras e ideias.
Aptidão numérica (N)
Facilidade na manipulação de números.
Fator Espacial (S)
Compreensão de transformações de figuras num espaço bi ou tridimensional.
Velocidade perceptiva (P)
Avaliação rápida e eficiente de semelhanças ou diferenças em figuras.
Velocidade de encerramento (Cs)
Capacidade para reconstruir uma imagem ou gestalt quando partes do estímulo estão omissas.
Raciocínio indutivo (I)
Raciocínio do específico para o geral.
Memória associativa (Ma)
Aptidão para evocar unidades de informação fornecidas em pares.
Aptidão mecânica (Mk)
Resolução de situações que envolvam os princípios da física, da mecânica ou outros conhecimentos práticos.
Flexibilidade de encerramento (Cf)
Aptidão para reconhecer determinado padrão de estímulos num determinado campo perceptivo mais global.
Amplitude de memória (Ms)
Evocação de informação solta, recentemente apresentada.
Ortografia (Sp)
Aptidão para reconhecer palavras com erros ortográficos.
Avaliação estética (E)
Aptidão para detectar qualidades artísticas.
Memória significativa (Mm)
Memorização de pares de elementos entre os quais existe uma ligação com significado.
Originalidade I (O1)
Fator que avalia a flexibilidade espontânea dos indivíduos.
Fluência ideacional (Fi)
Capacidade de produzir ideias sobre um determinado tópico.
Fluência de palavras (W)
Fator que respeita a produção rápida de palavras.
Originalidade II (O2)
Aptidão para combinar dois objetos afins para produzir um novo objeto.
Precisão (A)
Capacidade de movimentos rápidos e precisos envolvendo a coordenação sensório-motora.
Representação gráfica (Rd)
Capacidade de representação de estímulos através do desenho.



                                                                                                  Quadro: Fatores Secundários de Horn & Cattell
                                                                                                                           Fonte: Almeida (2002)

Brody e Brody, em 1976, defendem que a divisão entre inteligência fluida e cristalizada não se pode confundir com a suposição de dois fatores primários independentes. Ambas se relacionam de forma moderada e positiva, o que não impede origem e natureza distintas: gf traduz uma aptidão essencialmente biológica, gc uma capacidade decorrente da aculturação dos indivíduos. Com efeito, o desenvolvimento e a aquisição das aptidões depende não só dos processos de aculturação (experiências educativas), mas também do grau de gf de cada sujeito. A inteligência fluida funcionaria, assim, como o potencial intelectual do indivíduo (ALMEIDA, 2002).

Um terceiro modelo hierárquico de inteligência foi desenvolvido por vários autores que recorreram à análise fatorial, conforme está disposto na figura abaixo.

No nível inferior, aparecem as aptidões intelectuais defendidas por Thurstone. No nível intermédio, surgem fatores ditos gerais e já mais próximos da teoria de Horn-Cattell: Inteligência fluida (Gf) que abarca fatores primários tais como Indução (I), Raciocínio geral (R) e Cognição das relações figurativas (CFR); Inteligência cristalizada (Gc) que abarca fatores primários como a Compreensão verbal (V) e a Cognição de relações semânticas (CMR); o fator geral de Visualização (Gv) que abarca a Visualização (Vz), Orientação espacial (S) e Flexibilidade de encerramento (Cf); o fator de geral velocidade (Gs) e precisão do processamento de informação em tarefas cognitivas de não alta complexidade cognitiva, e que abarca fatores primários como a aptidão Numérica (N) e a aptidão Perceptiva  (P); e o fator geral de Evocação (Gr) da informação estruturada em conhecimento, ou seja, na memória em longo prazo, e que abarca fatores primários como a Fluência de ideias (Fi) e a Fluência de palavras (Fw). No nível superior, encontramos um fator de inteligência geral (g), no qual todas as aptidões de segunda ordem apresentam saturações elevadas (como a saturação de gf é próxima da unidade, este fator g pode assumir-se como equivalente à inteligência fluida) (ALMEIDA, 2002, P. 12)


Figura: Modelo Hierárquico de Gustafsson
                                                               Fonte: Almeida (2002, p.12)

Um quarto modelo hierárquico foi desenvolvido por Horn e Noll, conforme se apresenta na Figura 04.  E ainda segundo Almeida (2002), o modelo concebe nove aptidões dispostas no quadro abaixo:




APTIDÕES
CAPACIDADES
Gf
Inteligência fluida
Capacidade para apreender relações entre estímulos e para fazer inferências e compreender implicações entre os estímulos, particularmente em tarefas novas e complexas.
Gc
Inteligência cristalizada
Capacidade para adquirir em extensão e profundidade o conhecimento da cultura dominante.
Gq
Conhecimento quantitativo
Capacidade para usar informação quantitativa e para manipular símbolos numéricos.
Glr
Armazenamento e recuperação da informação à longo prazo
Capacidade para armazenar informação por um longo período de tempo e para recuperá-la fluentemente mais tarde através de associações.
Gsm
Memória a curto prazo
Capacidade para manter em consciência a informação e evocá-la uns segundos depois.
Gs
Velocidade de processamento
Capacidade para rapidamente captar e responder a tarefas simples, em períodos de tempo curtos.
CDS
Velocidade de decisão correta
Capacidade para rapidamente decidir e responder com acuidade a tarefas de dificuldade moderada.
Ga
Processamento auditivo
Capacidade para perceber padrões de sons, para manter a consciência da ordem e do ritmo de sons sob condições de distorção e distração, e para compreender relações entre diferentes grupos de sons.
Gv
Processamento visual
Capacidade para perceber e manipular símbolos variando a forma e identificando variações na sua configuração espacial
 

Quadro: Modelo Hierárquico de Inteligência de Horn e Noll
Fonte: Adaptado de Almeida (2002)

Como se pode observar, os fatores do modelo hierárquico de inteligência de Horn & Noll, apresentam níveis em sequencia de tratamento da informação, assumindo a forma figurativa e a verbal.

Figura: Modelo Hierárquico de Inteligência de Horn
                                                               Fonte: Almeida (2002, p.13)

O quinto modelo hierárquico da inteligência pertence a Jack Carroll, e foi apresentado, mais recentemente, em 1993, como se observa na figura abaixo. O modelo, construído através da análise de dados coletados por longos sessenta nos, ou seja: entre os anos de 1927 e 1987, compreende três estratos: (1) Estrato I, que inclui muitas estritas capacidades específicas, por exemplo: capacidade de soletração, rapidez de raciocínio; (2) Estrato II, que abrange várias capacidades gerais, por exemplo: inteligência fluida e inteligência cristalizada; (3) e o Estrato III, que é justamente uma inteligência geral separada, muito semelhante ao fator g de Spearman.

Desses estratos, o mais interessante é o estrato médio, que não é demasiadamente estrito, nem demasiadamente abrangente. Além da inteligência fluída e da inteligência cristalizada. Carroll inclui no estrato médio os processos de aprendizagem e de memória, a percepção visual, a percepção auditiva, a produção fácil de ideias (similar à fluência verbal) e a rapidez que inclui tanto a mera rapidez de resposta, quanto à rapidez da resposta acurada). Apesar de Carroll não ter iniciado um novo empreendimento, pois muitas das capacidades, em seu modelo, tinham sido mencionadas em outras teorias, ele integra magistralmente uma grande e variada autoridade ao seu modelo [   ] (STERNBERG, 2002, p. 407).

Figura: Modelo Hierárquico de Inteligência de Carroll
Fonte: Hernández (2004, p.15)

O estudo de Carroll encerra um período de busca por componentes da inteligência e levou a um novo patamar as pesquisas da abordagem psicométrica. Atualmente, a tendência é ampliar o enfoque dos estudos da inteligência englobando variáveis cognitivas e não cognitivas num esquema ou modelo de processamento de informação. Um desses novos modelos é o resultado da união das teorias que melhor embasamento empírico apresenta a Teoria de Inteligência Fluída e Cristalizada de Cattell e Horn e a Teoria dos Três Estratos de Carroll, dando origem ao que se denominou de Teoria Cattell-Horn-Carroll das Habilidades Cognitivas, ou Teoria CHC, com acréscimos de processamento de informação, onde apresenta a nova distribuição das habilidades específicas. Das setenta e cinco, as seis que estão em itálico correspondem àquelas que Carroll considera relacionadas ao desempenho acadêmico e não à inteligência; as dezessete habilidades em negrito, por sua vez, correspondem àquelas que foram distribuídas em habilidades diferentes de sua proposta original. (HERNÁNDEZ, 2004 apud FLANAGAN, MCGREW & ORTIZ, 2001).

Flanagan, McGrew e Ortiz (2000) consideram o modelo Cattell-Horn-Carroll como a mais completa descrição de inteligência da atualidade. É o resultado da análise de centenas de conjuntos de dados não restritos a um só tipo de bateria de testes. Os autores relatam que isso permitiu identificar de forma mais clara a relação entre a inteligência e o desempenho acadêmico. Distribuindo-se os dez domínios de habilidades amplas num continuum observa-se num extremo as habilidades mais cognitivas, relacionadas às habilidades gerais resultantes de experiências mais informais e não relativas à escolaridade. No extremo oposto localizam-se as habilidades especializadas, resultantes de experiências educacionais formais (HERNÀNDEZ, 2004, p. 21).

Segundo Hernàndez (2004), Flanagan, McGrew e Ortiz (2000) elaboraram o esquema visto na figura abaixo, onde se vê da direita para a esquerda, as habilidades mais relacionadas à escolaridade referem-se ao conhecimento matemático e à leitura e escrita. A inteligência cristalizada remete a um processo intermediário entre cognição e aprendizagem, pois envolve não apenas processos gerais de pensamento, como desenvolvimento da linguagem, mas também processos mais relacionados à aprendizagem, como por exemplo, sensibilidade gramatical. Ressalta-se que a inteligência cristalizada não é sinônimo de desempenho acadêmico, pois não se refere apenas aos conteúdos aprendidos, mas também aos processos cognitivos. As habilidades restantes: processamento auditivo, inteligência fluída, processamento visual, recuperação de memória de longo prazo, memória de curto prazo, velocidade de decisão e velocidade de processamento, são consideradas as habilidades cognitivas que são menos influenciadas pelas atividades acadêmicas embora exerçam influência na aprendizagem, isto é, a escolaridade contribui apenas indiretamente para o desenvolvimento dessas habilidades, embora o nível de desenvolvimento cognitivo que o indivíduo atinge nessas habilidades favoreça o seu desempenho acadêmico.

Um exemplo disso refere-se à habilidade de processamento auditivo, especificamente a habilidade de compreender o estímulo auditivo em condições inadequadas. No cotidiano de sala de aula, mesmo que o professor fale pausada e adequadamente, essa estimulação sonora não é suficiente para garantir o desenvolvimento da capacidade da criança em discriminar o estímulo auditivo. Mas, o contrário é verdadeiro, a criança que tiver um desenvolvimento aquém do esperado nessa habilidade pode apresentar dificuldades de aprendizagem por não compreender o que o professor está falando.




Figura: Esquema da distribuição das habilidades no continuum.
Fonte: Hernández (2004, p.21)

Modelo da Representação Radial de Complexidade – RADEX

Ainda de acordo com Hernàndez (2004), outro modelo é a proposta de Mashalek, Lohman e Snow, representado na figura abaixo, resultado de uma análise do modelo Radex de Guttman à luz dos novos modelos psicométricos.

Para Sternberg (1990), Louis Guttman (1916-1987), em 1954, apresentou uma proposta diferente dos modelos hierárquicos, onde se aplicou a técnica de análise multidimensional, permitindo a integração das teorias fatoriais ou psicométricas com o processamento humano de informação. Neste caso, enquanto as teorias psicométricas realizam uma análise mais generalista das capacidades humanas, o processamento humano de informação proporciona análises mais detalhadas destas mesmas capacidades.

Figura: Modelo da Representação Radial de Complexidade - RADEX
Fonte: Hernández (2004, p.25)

Guttman compreendia as habilidades da inteligência como facetas que se relacionam entre si, distribuindo seus resultados num espaço euclidiano e não numa árvore ou estrutura. A técnica foi apresentada em 1968, e seu objetivo era encontrar o menor espaço entre coordenadas em uma configuração de pontos. O modelo é integrado por duas partes, que são denominadas de simplex e circumplex. O simplex refere-se à distância que um determinado ponto, no caso uma medida de habilidade, tem do centro, e o circumplex refere-se ao arranjo que essas medidas adotam ao redor do centro, distribuindo-se de acordo com as correlações entre elas (HERNÀNDEZ (2004)

Diversos autores (Snow, Kyllonen e Marshalek, 1984; Sternberg, 1990; Carroll, 1993) relataram a importância das ideias de Guttman a respeito do Radial Expansion of Complexity, apresentadas em 1954, mesmo que as mesmas não tenham tido grande impacto na época. Esse modelo abarca informações que a análise fatorial não explora. Carroll (1993) relata que para Guttman a inteligência deveria ser descrita em termos de "sentenças mapeadoras" através das quais se podem descrever as relações entre cada uma de suas facetas. Para ele, a realização de um indivíduo numa tarefa com determinado nível de dificuldade significa que ele provavelmente obterá sucesso em outras tarefas do mesmo nível e falhará naquelas com nível maior.

Sua proposta de Representação Radial de Complexidade (Radial representation of complexity) ou RADEX distribuía os resultados nos diversos testes realizados pelos indivíduos no espaço euclidiano no qual quanto menor a distância entre dois pontos, maior a correlação entre eles. Após a distribuição dos resultados no espaço, pode-se subdividi-lo em facetas, como fatias de uma torta, organizando-os de acordo com as correlações e as variáveis psicológicas envolvidas na realização dos mesmos testes.

E um último modelo é a proposta de Acherman sobre a inteligência de adultos a Teoria da Inteligência-como-processo, Personalidade, Interesses, Inteligência-como-conhecimento - PPIK, que também amplia a proposta de Cattell e Horn de inteligência fluída e cristalizada acrescentando-se ainda, aspectos de personalidade e interesse.
           
Abordagem Dinâmica da Inteligência

Por outro lado, a abordagem da Psicologia Dinâmica interpreta, de forma diferente, os dados obtidos por meio dos testes psicológicos.

Os dados obtidos nos testes deixaram de ser considerados como medidas da inteligência. Passaram a ser vistos como medidas apenas de eficiência do sujeito e as alterações dessa eficiência encaradas como sintomas de perturbações globais e não como indicadores de potencial intelectual deficiente. [   ] Assim, nesta abordagem, o termo inteligência é questionado, porque supõe uma existência distinta do organismo na sua totalidade. A inteligência existiria como algo, ou algum fator no indivíduo, que poderia ser medido e avaliado. [    ] Nesta abordagem dinâmica, a inteligência passa a ser um adjetivo - inteligente - que qualifica a produção cognitiva e intelectual do homem. Por isso, nesta abordagem, os dados obtidos nos testes não são medidas da inteligência, mas medidas da eficiência intelectual do indivíduo (BOCK et al, 2001, p.183 apud ANCONA-LOPEZ, 1987, p.52, grifo nosso).

Para esta abordagem, os níveis baixos apresentados nos testes, não significa que o indivíduo tem pouca inteligência, até porque o indivíduo deve ser visto na sua globalidade.

De acordo com Bock et al (2001), o indivíduo  quando apresenta dificuldades de verbalizar, de resolver problemas, ou de aprender o que lhe é ensinado deve ser compreendido, não como tendo deficiência intelectual ou sendo pouco inteligente, mas por, provavelmente, estar vivendo num momento de dificuldades psicológicas, ou mesmo conflitos relacionados ao seu desenvolvimento, provocando sintomas de pouca produção intelectual, e que deve ser recuperado em todas as suas capacidades globais.

Porquanto, nesta abordagem, os testes de inteligência passam a ser instrumentos auxiliares na identificação das dificuldades, que são encaradas como sintomas de conflitos, e ainda ajudam na sua recuperação, ao invés de fazer apenas um trabalho de classificação, e às vezes até, os testos podem ser dispensáveis.

O estudo do comportamento intelectual ou cognitivo do indivíduo, ou outro qualquer, é feito em função de sua personalidade e de seu contexto social. O indivíduo faz parte de um meio, no qual age, manipula, transforma, desenvolvendo concomitantemente suas estruturas psíquicas. A inteligência deixa de ser estudada como uma capacidade isolada, para ser pensada como capacidade cognitiva e intelectual que integra a globalidade humana. Assim, quando é enfocada uma produção intelectual do homem, esta é analisada nos seus componentes cognitivos, afetivos e sociais (BOCK, 2001, p. 184, grifo nosso).

A noção de unidade do organismo e totalidade de reações enfatizou a impossibilidade de se decompor a personalidade em funções isoladas, visto dessa forma, a inteligência, nesta abordagem, não tem lugar de destaque, e é compreendida como capacidade cognitiva ou intelectual, não podendo ser estudada, analisada, nem compreendida, isolada da totalidade de aspectos, aptidões, capacidades do ser humano. Assim, todas as expressões do homem são carregadas de elementos psíquicos, decorrentes de sua capacidade cognitiva, afetiva, corporal. E os atos, que são adjetivados como inteligentes, não estão isentos de componentes afetivos, além dos cognitivos (BOCK, 2001).

A Psicologia Dinâmica entende que o ser humano, quando está bem psiquicamente, consegue tratar de forma adequada os seus conflitos, enfrentando os problemas e desafios que lhe são apresentados, com criatividade, em melhores condições, grandes atitudes e atos considerados inteligentes.

Binet e Henri, num artigo publicado em 1895, na França, criticaram a maioria das séries disponíveis de testes, por serem demasiadamente sensoriais e por se concentrarem, indevidamente, em habilidades simples e especializadas. Além disso, sustentavam que, na mensuração de funções mais complexas, não é necessária grande precisão, pois as diferenças individuais são maiores em tais funções. Propunha-se uma extensa e variada lista de testes, abrangendo funções como a memória, imaginação, atenção, compreensão, sugestionabilidade, apreciação estética e muitas outras (ANASTASI, 1972, p.11 apud BINET: HENRI, 1895, p.411-463, grifo nosso).