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s bases da
Modernidade foram montadas no século XVII e de grande importância para a
ciência. Na Física, o método de observação experimental, em conjunto com o
emprego da Matemática, regula as definições quantitativas.
Em 1610, o italiano Galileu Galilei (1564-1642) estuda a queda dos corpos, realizando as primeiras
experiências da Física moderna.
Por esta época, René Descartes (1596-1659)[1]
postula a separação entre mente e corpo, afirmando que o homem possui uma substância material e uma substância pensante, e que o corpo,
desprovido do espírito, é apenas uma máquina. Esse dualismo mente-corpo torna possível o estudo do corpo humano morto, o que
era impensável nos séculos anteriores – o corpo era considerado sagrado pela
Igreja, por ser a sede da alma -. E dessa forma possibilita o avanço da Anatomia e da Fisiologia, que iria contribuir em muito para o progresso da própria
Psicologia (BOCK, 2001).
E mais, se Hegel (1770-1831),[2]
em sua História da filosofia, escreveu
que o autor do Discurso do Método (1637) foi o verdadeiro iniciador da
filosofia moderna, é correto afirmar que o papel de Descartes não foi menos
considerável nos outros domínios da vida cultural, e a psicologia,
especialmente, recebeu do cartesianismo, embora muitas vezes por via da reação,
extraordinário impulso (MUELLER, 1978).
O Racionalismo
No início da era moderna, ainda em função das
disputas seculares entre realistas e nominalistas[3], os defensores do racionalismo e do empirismo mantiveram suas posições contrarias. Os racionalistas convencidos de que a
verdadeira fonte do conhecimento é a ratio,
ou seja, as idéias são inatas[4] é o ponto de partida para
o processo de dedução. Já os empiristas defendem que a fonte do
conhecimento são os sentidos que inscrevem os dados na tabula rasa da mente e que por isso recorrem ao método da indução e a coleta de dados,
conforme foi recomendado por Francis Bacon (1561-1626).
Para Rosenfeld (1993, p.60-61), ambos os métodos,
quando usados de modo unilateral, são defeituosos; os racionalistas deixam de testar
as suas observações pela observação; os empiristas esquecem-se de que qualquer
coleta de dados exige uma hipótese e categorias apriorísticas prévias, para
selecionar e organizar os dados de experiência. As grandes conquistas da
ciência, com efeito, resultaram de uma fusão de ambas as tendências, isto é,
pela formulação de hipóteses tentativas, expressas de forma matemática, e pelo
teste delas por meio da observação e variáveis das condições de observação.
Há de importante a se destacar que o matemático
alemão Johannes Kepler[5]
(1571-1630) promoveu a fusão entre o Método
Indutivo e o Método Matemático
Dedutivo.
Um raciocínio dedutivo parte de um enunciado geral
e tenta aplicá-lo a fatos particulares: do geral aos particulares, poder-se-ia
escrever pluralizando o vocábulo particular. Assim, se os homens, em geral, são
mortais, um homem particular e cada um dos outros particulares que com ele se
parecem, enquanto homens são mortais. O raciocínio indutivo vai no sentido
contrario: de particulares — ainda no plural — para o geral. Assim, se se
observa que um homem particular e os demais homens particulares são mortais,
pode-se inferir, ou seja, tirar uma conseqüência dos fatos, que os homens são
mortais. O raciocínio dedutivo permite ampliar conhecimentos já disponíveis a
outros fatos para verificar, especialmente, se estão de acordo. O indutivo
permite antes construir novos conhecimentos, chegando, por dedução, a ampliação
desses conhecimentos. Esses tipos de raciocínios encontram-se no centra de um
procedimento metódico de construção do saber. (LAVILLE; DIONE 1999, p.22)
O Empirismo
Quando trata das
Revoluções Científicas, ROBERTS (2001) registra que um dos mais importantes
avanços da ciência medieval foi a invenção da investigação intelectual por meio
do experimento sistemático. E um dos grandes defensores foi Lord Francis Bacon
(1561-1626), a partir da obra Novum
Organum Scientiarum, Ensaios.
Para Bacon, o domínio da natureza pelo
homem se daria através do saber, juntando as tradições sábias com as populares.
Essencialmente, sua obra filosófica está baseada, na substituição da lógica
dedutiva medieval, por um novo método experimental e indutivo. O Novum
Organum é o início de um ambicioso projeto de síntese total do conhecimento
humano.
A percepção de que as experiências podiam
produzir resultados mais frutíferos ficou mais forte à medida que melhores
instrumentos se tornaram disponíveis. Telescópios, microscópios, marcadores de
tempo mais precisos, tudo isto abriu novas áreas de investigação (ROBERTS, 2001).
Depois de alardear sobre os obstáculos que
impedem o caminhar da verdadeira ciência, Bacon sistematiza as regras da
indução, ignora a importância do método analítico e das matemáticas e mostra-se
adversário do método criado por Galileu, vez que nele os fenômenos estão
isolados do seu meio natural e apenas são estudados nos seus aspectos
mensuráveis.
Para a constituição
de axiomas deve-se cogitar de uma forma de indução diversa da usual até hoje
[...] Com efeito, a indução que procede por simples enumeração é uma coisa
pueril, leva a conclusões precárias, expõe-se ao perigo de uma instância que a
contradiga. Em geral, conclui a partir de um número de fatos particulares muito
menor que o necessário e que são também os de acesso mais fácil. Mas a indução
que será útil para a descoberta e demonstração das ciências e das artes deve
analisar a natureza, procedendo às devidas rejeições e exclusões, e depois,
então, de posse dos casos negativos necessários, concluir a respeito dos casos
positivos [...] Na constituição de axiomas por meio dessa indução, é necessário
que se proceda a um exame ou prova: deve-se verificar se o axioma que se
constitui é adequado e está na exata medida dos fatos particulares de que foi
extraído, se não os excede em amplitude e latitude, se é confirmado com a
designação de novos fatos particulares que, por seu turno, irão servir como uma
espécie de garantia (BACON, 2003, p.56-57)
Mais adiante, o
filósofo britânico John Locke (1632-1704), com seu método psicogenético[6], propõe a formação do
conhecimento desde o início até o seu pleno desenvolvimento, através da elaboração
do empirismo de forma sistemática, onde a mente é um papel branco e todas as
idéias decorrem, sem exceção, da experiência. Em sua teoria, Locke atribui uma forma
de experiência dupla: uma pelo sentido externo, através da sensação, e outra de sentido interno, pela autoconsciência ou reflexão.
Segundo Resenfeld (1993), Locke
teorizou que a sensação como tal não
passa ainda de mero processo físico.
Já a percepção é um processo psíquico e como tal envolve
desde o início certo grau de julgamento – senão a esfera seria vista como mero
círculo – Assim, a percepção adulta já é uma atividade complexa, envolvendo
juízos e colorindo a sensação com experiências anteriores e hábitos mentais.
Todo aspecto da mente envolve a natureza total da mente; Locke tem uma idéia
clara da unidade da mente e seu empirismo, longe de ser radical, representa um
compromisso com teses fundamentais do racionalismo.
Quanto à retenção e memória – que fixam de preferência as idéias originalmente
acompanhadas de prazer ou dor – , tornam a mente capaz de comparar – formando idéias de relação – e abstrair
– formando idéias abstratas – e
combinar – formando idéias complexas.
Assim, todas as idéias, por mais abstratas ou complexas que sejam, sempre têm
origem nas idéias simples, na experiência sensorial
ou interna. As nossas percepções não refletem fielmente os
objetos que as causam. Na associação, Locke antecipa a lei da repetição, ao acentuar a importância do hábito no
estabelecer conexões entre as idéias. A Associação não depende somente de relações espaciais e temporais: também a
emoção entra em jogo e toda a composição dos nossos pensamentos pode ser
afetada por aversões e simpatias.
No
campo da educação, Locke compilou uma série de preceitos sobre aprendizado e desenvolvimento. Segundo ele, o aprendizado depende primordialmente
das informações e vivências às quais a criança é submetida e que ela absorve de
modo relativamente previsível e passivo. É, portanto, um aprendizado de fora
para dentro, ao contrário do que defenderam alguns pensadores de linha idealista[7],
como o suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Johann Heinrich Pestalozzi
(1746-1827), e a maioria dos teóricos da educação contemporâneos. Os dois
fundamentos iniciais de sua obra mais importante, Ensaio sobre o Entendimento Humano, são a negação da existência de idéias inatas - o que contrariava o
legado do filósofo mais influente da época, o francês René Descartes
(1596-1650) - e o princípio de que todas as idéias nascem da experiência,
refundando, na ciência moderna, o empirismo. Em suma, Locke acreditava que as
crianças vêm ao mundo sem nenhum conhecimento, mas já trazendo inclinações e
principalmente um temperamento. O educador deveria observar as características
emocionais do aluno para submetê-lo a diferentes métodos de aprendizado (NOVA
ESCOLA, 2010).
Outro empirista foi o suíço
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Nome ligado à Revolução Francesa, seus
pensamentos nem sempre harmonizavam com outros iluministas, tais como: Voltaire
(1694-1778) e Denis Diderot (1713-1784). Enquanto estes exaltavam a razão, ele
defendia a emoção. Rousseau via o jovem como um ser integral, e não uma pessoa
incompleta, e intuiu na infância várias fases de desenvolvimento, sobretudo
cognitivo. Foi, portanto, um precursor da pedagogia de Maria Montessori
(1870-1952) e John Dewey (1859-1952). Ainda sistematizou toda uma nova
concepção de educação, depois chamada de Escola
Nova, e que reúne vários pedagogos dos séculos XIX e XX.
Para Mueller (1978, p.220):
Rousseau concebe a educação como a própria formação
da vida espiritual, inseparável de uma liberdade que não poderia admitir
nenhuma ingerência extrínseca. Esse modo de ver implica, como em Sócrates, a
inerência dos valores no espírito humano, uma fé robusta em seu desenvolvimento
espontâneo. Não é que se vá reencontrar, em Jean-Jacques, o inatismo platônico.
Seguindo a escola de Locke, ele está convencido, ao contrário, de que tudo nos
vem da experiência. Tudo, excetuada a natureza livre e perfectível do homem,
constitutiva de sua essência autêntica e que o indivíduo está em condições de
experimentar em si mesmo, uma vez colocado sob condições favoráveis a esse
desabrochar. É assim que Rousseau distingue entre educação positiva e educação
negativa.
[1] Por
vezes chamado de "o fundador da filosofia moderna"
e o "pai da matemática moderna", é considerado um dos pensadores mais
importantes e influentes da História do Pensamento Ocidental. Inspirou
contemporâneos e várias gerações de filósofos posteriores; boa parte da
filosofia escrita a partir de então foi uma reação às suas obras ou a autores
supostamente influenciados por ele. Muitos especialistas afirmam que a partir
de Descartes inaugurou-se o racionalismo da Idade Moderna. Décadas mais tarde, surgiria nas Ilhas Britânicas
um movimento filosófico que, de certa forma, seria o seu oposto - o empirismo, com John Locke e David Hume.
[2]
Filósofo da totalidade, do saber absoluto, do fim da história,
da dedução de toda a realidade a partir do
conceito, da identidade que não concebe espaço para o contingente, para a
diferença; filósofo do estado prussiano, que hipostasiou o Estado - todas essas são algumas das recepções da filosofia
de Hegel na contemporaneidade. É difícil dizer até que ponto essas
qualificações são justas para com a filosofia hegeliana.
[3] O nominalismo é a doutrina que não
admite a existência do universal nem no mundo das coisa, nem no pensamento.
Surgiu na sua forma mais radical no séculos XI por intermédio de Roscelino de
Compiègne. Esse atribuía universalidade aos nomes, daí a origem do termo. Para
o nominalismo o universal é um puro nome, um flatus vocis (pura
emissão fonética). Para o realismo os universais
existem objetivamente, seja na forma realidades em si, transcendentes em
relação aos particulares
(como em Platão, universais ante rem), ou como imanentes encontrados nas
coisas individuais (como para Aristóteles, universidade in re). Para o conceitualismo, os universais
são apenas conteúdos de nossa mente, intelegíveis ou conceitos, representações
do intelecto que as deriva das coisas (universalia post rem) e dessas
guarda alguma semelhança.
[4] Idéia com a qual a gente nasce, que não se
aprende. A hipótese de ideias inatas foi mantida por Sócrates e Leibnitz e é sustentada por Chomsky, entre
outros. Em Descartes, as ideias inatas são aquelas
que se originam da própria mente, independentemente de qualquer experiência
anterior, e incluindo as ideias de um Deus Perfeito, da substância pensante e da matéria extensa.
[5] Em 1596,
Kepler publicou Mysterium Cosmographicum, onde expôs argumentos
favoráveis às hipóteses heliocêntricas. Em 1609
publicou Astronomia Nova… De Motibus Stellae Martis, onde apresentou as
três leis do movimento dos planetas, que hoje levam seu nome.
[6] “Psicogenético”
é o termo empregado para descrever a pedagogia criada a partir das teorias e
pesquisas piagetianas. Significa que o processo pedagógico modifica-se
sucessivamente, de acordo com o estádio de desenvolvimento mental
(psicogênese). O Nível mental da criança é que determina como o professor deve
apresentar as situações didáticas, pois, em cada estádio do desenvolvimento a
criança tem uma maneira diferente de aprender.
[7] O Idealismo
é uma corrente filosófica
que emergiu apenas com o advento da modernidade, uma vez que a posição central da
subjetividade é fundamental. Seu oposto é o materialismo. Tendo suas origens a partir da
revolução filosófica iniciada por Descartes e o seu cogito, é nos pensadores alemães que o Idealismo [1] está em geral associado, desde Kant
até Hegel, que seria talvez o último grande
idealista da modernidade. Muitos, ainda, acreditam que a teoria das idéias de Platão é historicamente o primeiro dos
idealismos, em que a verdadeira realidade está no mundo das idéias, das formas
inteligíveis, acessíveis apenas à razão.