terça-feira, 13 de agosto de 2013

EDUCAÇÃO: TEORIAS DA APRENDIZAGEM


A
História da psicologia é sistematicamente escrita, ora de forma cronológica, obedecendo a um histórico progressivo no tempo, e neste sentido destacam-se dois importantes historiadores: Boring[1] (1929) e Murphy[2] (1949), e ora através da distribuição por Escolas Teóricas, narrando suas características, formas de pensar a psicologia etc, nesta linha encontramos: Heidbreder (1933), Woodworth e Sheedan, (1964), Wolman (1960), e Marx e Hillix (1963).

De outra forma, como exemplo, narrado através da biografia de grandes psicólogos, pode-se citar: a History of Psychology de David Hothersall (1990), e uma antologia de textos clássicos de Herrnstein e Boring (1971).

Há, entretanto, na Psicologia, uma grande diversidade de teorias. Alguns autores preferem organizar sua história sob o ponto de vista de cada uma. Exemplo: as Teorias de Personalidade Hall e Lindsey (1957), e as Teorias da Aprendizagem Hilgard (1956). A linha adotada aqui é o da Teoria da Aprendizagem, tendo como protagonista os escritos de Hilgard (1904-2001).[3]   

CLASSIFICAÇÃO DAS TEORIAS DA APRENDIZAGEM

Torna-se importante, e para um melhor entendimento desta abordagem, apresentar as teorias conforme sua classificação.

As teorias de aprendizagem pertencem a duas famílias principais: teorias de estímulo-resposta e teorias cognitivas; mas nem todas as teorias pertencem a estas famílias. As teorias de estímulo-resposta incluem membros diferentes como as teorias de Thorndike, de Guthrie, de Skinner e de Hull. As teorias cognitivas incluem pelo menos as de Tolman, os psicólogos clássicos da Gestalt e Lewin. As teorias do funcionalismo, as psicodinâmicas e as teorias probabilísticas dos construtores de modelo não são nitidamente classificáveis nestes termos. As linhas de separação entre as duas famílias de teorias não são as únicas existentes entre as teorias de aprendizagem; há outras controvérsias específicas sobre as quais podem diferir pertencentes a uma mesma família (HILGARD, 1973, p.10-11, grifo nosso).
           
A abordagem dará ênfase às Teorias do Estímulo-Resposta, conhecidas também como do Condicionamento, ou ainda Comportamentais; e as Teorias Cognitivas.   

Para Bock et al (1993), as teorias do condicionamento, ou estímulo-resposta, definem a aprendizagem pelas suas consequências comportamentais e enfatizam as condições ambientais como forças propulsoras da aprendizagem, e as cognitivistas são como um processo de relação do sujeito com o mundo externo e que tem consequências no plano da organização interna do conhecimento – organização cognitiva.
           
CONTROVÉRSIAS BÁSICAS ENTRE AS TEORIAS DA APRENDIZAGEM

As teorias seriamente elaboradas e que obedecem a uma lógica metodológica, apesar das controvérsias, têm seus resultados respeitados. Os teóricos, embora discordem sobre os argumentos, aceitam as descobertas estabelecidas em experimentos que possam ser repetidos, até para não perderem status e manterem as suas sob o respeito dos pares. Ademais, algumas teorias que antes pareciam bem definidas quanto às suas diferenças, hoje estas diferenças apresentam-se turvas. 

A primeira regra que devemos estar prontos a aceitar, à medida que julgamos o mérito relativo das diferentes teorias, é a seguinte: Todos os teóricos aceitam todos os fatos. Algumas descobertas experimentais são postas em dúvida quando primeiro anunciadas e o status da descoberta como fato pode por muito tempo ser posto em dúvida; mas, uma vez estabelecido esse status, todos aceitam o fato verdadeiro. Daí as diferenças entre dois teóricos serem primariamente diferenças de interpretação. Ambas as teorias podem concordar com os fatos razoavelmente bem, mas o proponente de cada teoria acredita ser o seu ponto de vista o mais produtivo. Estaremos melhor preparados para descobrir os modos como as teorias são validadas ou modificadas mais tarde quando estivermos familiarizados com elas em maiores detalhes. No momento, precisamos estar preparados para aceitar a verdade histórica de que as teorias oponentes têm grande valor de sobrevivência e de que um apelo aos fatos como uma forma de escolha entre as teorias é um processo muito complexo, e não tão decisivo na prática como poderíamos esperar que fosse (HILGARD, 1973, p.10-11).   

De forma geral, e a priori, pode-se apontar e discorrer sobre três controvérsias que envolvem as teorias estímulo-resposta e as cognitivistas, ou seja: (i) à questão do que é aprendido e de como é aprendido; (ii) à questão do que mantém o comportamento que é aprendido; (iii) e a maneira como se soluciona uma nova situação-problema.  

A questão do que é aprendido e de como é aprendido

Para os teóricos do condicionamento, aprendemos hábitos, isto é, aprendemos a associação entre um estímulo e uma resposta e aprendemos praticando; para os cognitivistas, aprendemos a relação entre ideias (conceitos) e aprendemos abstraindo de nossa experiência (BOCK. et al, 1993, p. 100). 

Hilgard (1973) trata essa controvérsia como: Aquisição de Hábitos versus Aquisição de Estruturas Cognitivas. Ainda segundo o autor: O teórico do estímulo-resposta e o teórico cognitivo surgem com soluções diferentes ante a questão: O que é aprendido? A solução do primeiro é hábitos; a do último é estruturas cognitivas. A primeira solução faz apelo ao senso comum: todos nós sabemos que desenvolvemos habilidades, praticando-as; aquilo que aprendemos são respostas. Mas a segunda solução apela também ao senso comum; se localizarmos uma confeitaria, partindo de um certo ponto, poderemos encontrá-la partindo de um outro ponto porque sabemos onde ela esta; o que nós aprendemos são fatos. Uma habilidade ilustra um hábito aprendido; conhecer rotas alternadas ilustra estruturas cognitivas.

Mas, o psicólogo do estímulo-resposta se satisfaz em deduzir das leis da formação do hábito o comportamento que o teórico cognitivo acredita sustentar a sua interpretação. Daí não poder escolher entre as teorias apresentando ilustrações decisivas do que aprendemos, pois ambos os grupos de teóricos oferecerão explicações para todos os exemplos. As teorias em competição não teriam sobrevivido até agora se fossem incapazes de oferecer tais explicações (HILGARD, 1973, p. 13).

A questão do que mantém o comportamento que é aprendido

Para os teóricos do condicionamento, o comportamento é mantido pelo sequenciamento de respostas. Explicando melhor: uma resposta é, na realidade, um conjunto de respostas. Quando falamos no comportamento de abrir uma porta, é fácil perceber que ele é composto de diversas respostas intermediárias: pegar a chave na posição certa para que entre na fechadura, encaixá-la na fechadura, virar corretamente e abaixar então a maçaneta. São essas diversas respostas que, reforçadas (bem-sucedidas), preparam a etapa seguinte e mantêm a cadeia de respostas até que o objetivo do comportamento seja atingido. Para os cognitivistas, o que mantém um comportamento são os processos cerebrais centrais, tais como a atenção e a memória, que são integradores dos comportamentos (BOCK. et al, 1993, p. 101).

Esta questão Hilgard (1973) trata como: Intermediários Periféricos versus Intermediários Centrais, fazendo o seguinte relato: desde que Watson promulgou a teoria de que o pensamento era mera execução de movimento subvocais da fala, os teóricos do estímulo-resposta têm preferido descobrir respostas ou movimentos intermediários para servirem como integradores de sequências de comportamento. Tais movimentos intermediários produzidos podem ser classificados como mecanismo periférico, em contraste com os intermediários centrais (ideacionais). Os teóricos do estímulo-resposta tendem a acreditar que um tipo de resposta muscular encadeada, ligada talvez por respostas antecipatórias fracionárias ao objetivo, serve para manter um rato correndo até uma caixa-alimento distante. O teórico cognitivo, por outro lado, infere mais livremente processos cerebrais centrais tais como memórias ou expectativas, como integradores do comportamento que procura o objetivo.
           
As diferenças de preferência sobrevivem, neste caso, porque ambos os tipos de teóricos dependem das inferências do comportamento observado e as inferências não são diretamente verificadas em qualquer um dos casos. É potencialmente mais fácil verificar movimentos da língua relacionados com o pensamento do que descobrir no cérebro um traço de memória revivido, mas, na verdade, uma tal verificação não é oferecida com a precisão necessária para compelir a se acreditar na teoria. Nessas circunstâncias, a escolha entre a explicação periférica e a central não é forçada, e estar a favor de uma ou de outra posição depende de preferências sistemáticas mais gerais (HILGARD, 1973).

A maneira como se soluciona uma nova situação-problema

Para os teóricos do condicionamento ou estímulo-resposta, evocamos hábitos passados apropriados para o novo problema e respondemos, quer de acordo com os elementos que o problema novo tem em comum com outros já aprendidos, quer de acordo com aspectos da nova situação, que são semelhantes à situação já encontrada. Por exemplo: quando a criança aprende a dar laço nos sapatos, saberá dar laço em presentes, no vestido ou na fita do cabelo. Os cognitivistas acreditam que, mesmo no caso de haver toda a experiência possível com as diversas partes do problema, como saber todas as etapas para um laço, isso não garante que a solução do problema seja alcançada. Seremos capazes de solucionar um problema, se este for apresentado de uma forma, mas não de outra, mesmo que ambas as formas requeiram as mesmas experiências passadas para serem solucionadas (BOCK. et al, 1993, p. 101).

Ainda segundo a teoria cognitivista, o entendimento das principais variáveis que envolvem um caso posto, facilita um insight para a sua solução. Por exemplo, quando se coloca o desafio de montar um quebra-cabeça e se percebe o encaixe perfeito de uma das peças, isto ocorre sem que antes tenha havido qualquer tentativa.    

Visto pelo olhar de Hilgard (1973), esta controvérsia é denominada de: Ensaio e erro versus Insight na Solução de Problemas. E prossegue fazendo a seguinte indagação: Quando aquele que aprende confronta um problema novo, como é que ele chega à solução? e responde: O psicólogo do estímulo-resposta acha que ele convoca os hábitos passados apropriados para o problema novo e responde quer de acordo com os elementos que o problema novo tem em comum com outros familiares, quer de acordo com os aspectos da nova situação que são semelhantes a situações já encontradas. Se isto não o leva à solução, aquele que aprende recorre ao ensaio e erro, trazendo do seu repertório de comportamento uma resposta atrás da outra até que o problema seja resolvido.

Ainda segundo Hilgard (1973), o psicólogo cognitivista concorda com grande parte desta descrição sobre o que aquele que aprende faz, mas acrescenta interpretações que o psicólogo do estímulo-resposta não oferece. Ele assinala, por exemplo, que mesmo nos casos de haver toda a experiência que se possa exigir com as partes de um problema, não há o que garanta que aquele que aprende seja capaz de, com certas experiências passadas, alcançar a solução. Ele poderá ser capaz de solucionar o problema se este for apresentado de uma forma, mas não se for apresentado de outra, mesmo que ambas as formas requeiram as mesmas experiências passadas para serem solucionadas. Por outro lado, para o teórico cognitivo, o método preferido de apresentação permite uma estrutura perceptual que leva ao insight, isto é, à compreensão das relações essenciais do caso em questão.

O psicólogo do estímulo-resposta olha a história passada de quem aprende para encontrar a solução, e o psicólogo cognitivo olha para o presente da situação do problema. Tanto a preferência pelo passado do problema pelo psicólogo do estímulo-resposta, como pelo presente da solução pelo cognitivista, inibe a preferência por uma posição contraria. 

Não se deve deduzir, devido a essa diferença de preferência, que qualquer um dos teóricos esteja cego em relação à totalidade da situação de aprendizagem, Tanto os fatos do experimento do insight como os fatos da aprendizagem da habilidade são aceitos por ambos os teóricos. Devemos lembrar novamente que um único experimento não vai demolir nem a interpretação de acordo com o ensaio e erro e nem a interpretação de acordo com o insight Hilgard (1973, p.14)).



[1]Edwin Garrigues Boring (1886-1968) foi um psicólogo experimental americano que depois se tornou um dos primeiros historiadores da Psicologia.

[2] Gardner Murphy (1895-1979) foi um psicólogo americano especializado em psicologia social e personalidade, e parapsicologia. Autor de vários textos de psicologia, incluindo a introdução histórica à psicologia moderna (1929; 1949), Personalidade (1947), e as potencialidades do Homem (1958). Ele explorou especialmente a motivação, a personalidade e os processos criativos.


[3] Psiquiatra e professor americano, Ernest Ropiequit Hilgard, formou-se em Engenharia Química pela Universidade de Illinois. Na sua investigação, Ernest Hilgard estudou os processos de compreensão da leitura. Hilgard foi ainda um pioneiro no estudo da função da hipnose no comportamento e na resposta dos seres humanos.